CARTA DE GUIA
Mesmo com
este calor
eu quero ir.
Aos tropeções, aos bordos, de qualquer maneira,
porque há pessoas que estão à minha espera
e que nasceram pra eu me importar com elas.
Há vinte e dois anos que estou a falar de mim
e hei-de falar de mim a vida inteira:
tanta coisa que eu tenho para dizer,
e passar ao papel!
A anatomia da minha alma, principalmente,
que há-de ficar escrita,
pra que vejam como é esquisito um homem por dentro.
Aos tropeções, aos bordos, de qualquer maneira,
porque há pessoas que estão à minha espera
e que nasceram pra eu me importar com elas.
Há vinte e dois anos que estou a falar de mim
e hei-de falar de mim a vida inteira:
tanta coisa que eu tenho para dizer,
e passar ao papel!
A anatomia da minha alma, principalmente,
que há-de ficar escrita,
pra que vejam como é esquisito um homem por dentro.
Mas agora, neste momento,
e noutros iguaizinhos a este,
ponho de parte o binóculo com que me espreito
e graças ao qual tudo o que em mim é pequeno me parece grande
e vou prà frente, apesar do calor,
apesar de ir como um bêbado.
Há mãos estendidas, lábios secos.
Casas aonde o Sol tem pudor de entrar, de tão infectas.
Aonde Deus taparia o nariz, se chegasse à porta.
Quando as palavras são como pensos de linho,
não há nada melhor para a alma, feita de carne em chaga de um homem.
Por isso é que vou indiferente a este calor de Junho.
O binóculo fica à espera.
Eu fico à espera.
Largo barcos e redes,
não aconteça que os outros todos que estão à minha espera
tenham morrido já, quando eu chegar,
ou já não tenham ouvidos para as minhas palavras,
nem lábios que percebam
e noutros iguaizinhos a este,
ponho de parte o binóculo com que me espreito
e graças ao qual tudo o que em mim é pequeno me parece grande
e vou prà frente, apesar do calor,
apesar de ir como um bêbado.
Há mãos estendidas, lábios secos.
Casas aonde o Sol tem pudor de entrar, de tão infectas.
Aonde Deus taparia o nariz, se chegasse à porta.
Quando as palavras são como pensos de linho,
não há nada melhor para a alma, feita de carne em chaga de um homem.
Por isso é que vou indiferente a este calor de Junho.
O binóculo fica à espera.
Eu fico à espera.
Largo barcos e redes,
não aconteça que os outros todos que estão à minha espera
tenham morrido já, quando eu chegar,
ou já não tenham ouvidos para as minhas palavras,
nem lábios que percebam
a frescura
de água que
eu levar...
In Itinerário Paralelo
1 comentário:
Infelizmente, Sebastião da Gama não é Poeta muito conhecido entre nós, e eu aprecio-o tanto!
A culpa não é propriamente dos amantes de Poesia, e refiro-me não aos Poetas, mas aos que sem escrever poemas gostam de os ler e apreciam quem os escreve.
Esta «Carta de Guia» que nos apresenta não o conhecia eu, e este, conhecia-o o Cid Simões?
http://francis-janita.blogspot.com/2019/08/pobrinhapobrinha.html
Peço desculpa, não pretendo publicitar o meu espaço, mas gostaria de saber se conhece o poema.
Desejo-lhe um boa e poética noite.
Saudações blogueiras. :)
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