Mar novo
1
E a embarcação aparecia como um
barco de recreio. 
Do pescador a musculatura
dolorosamente suada 
merecia uma simples pincelada 
de silhueta negra 
impressionismo fácil 
afirmação exótica de que o dongo 
não andava sozinho. 
2
Mas é novo este azul    tela rasgada 
é novo o nosso olhar. 
É nova esta forma gestual de
espuma 
feita sabor de amor de guerra e
de vitória 
em nossas bocas férteis em nossa
pálpebras 
de antigo medo clandestino 
soletrando a lágrima 
quando era o nosso mar recordação
também 
escravizada: 
caminho secular de ir e não vir.
3
É nova esta areia 
este marulhar de fogo nos ouvidos
quase notícia do rebentamento
maior 
sobre o inimigo. 
É novo este calor como se o sol 
fosse um ananás coletivo
suculento 
rasgado pelos dedos da madrugada
mais quente 
e mais suave.
4
E é bom medir a água evaporada 
sobre a concha 
a alga 
a rocha. 
Medir também teu corpo natural 
onde encontrar a boca 
os pés 
os olhos 
a palavra.
5
E é bom verificar as mãos.
Principalmente 
as nossas mãos umedecidas pelo
mar. 
As mãos que tocam as coisas 
As mãos que fazem as coisas 
As mãos. As mãos terminal de
carga 
e de descarga do nosso pensamento
As mãos mergulhadas sob a água. 
na (re)descoberta tímida das
essências 
no pulsar submarino de uma nova
esperança. 
6
Tudo é fugaz 
entre o desenho do teu pé na
areia 
e a onda que desfaz 
a marca 
Entre a guerra e a paz 
retorno fisicamente o poema      a onda 
constante meditação primeira. 
Nós e as coisas.
Nada permanece que não seja 
para a necessária mudança. 
 Que o diga o mar.

Sem comentários:
Enviar um comentário