segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Menino Jesus

Este é o menino Jesus que me enternece e ilumina.


Vejo Nele todos os meninos Jesus que os abutres em festivo holocausto devoram pela fome.

O menino Jesus do jumento, do boi ou da vaquinha que o bafeja e aconchega nas palhinhas e é visitado pelos Reis Magos, esse menino Jesus que sonho para todas as crianças é o símbolo da hipocrisia que nos rege. É o enviado de um deus que promete a paz e o amor entre os Homens e nos mantém à beira do apocalipse.

Em cada cinco segundos um dos meus meninos Jesus morre de fome devorado pelos abutres que da fome alheia se alimentam.

Quem os poderá ignorar?




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terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Com Fúria e Raiva



Com Fúria e Raiva

Com fúria e raiva acuso o demagogo
E o
seu capitalismo das palavras


Pois é preciso saber que a palavra é sagrada
Que de longe muito longe um povo a trouxe
E nela pôs
sua alma confiada

De longe muito longe desde o início
O
homem soube de si pela palavra
E nomeou a
pedra a flor a água
E
tudo emergiu porque ele disse

Com fúria e raiva acuso o demagogo
Que se promove à sombra da palavra
E da
palavra faz poder e jogo
E transforma as
palavras em moeda
Como se fez com o trigo e com a terra

Sophia de Mello Breyner Andresen

in "O Nome das Coisas"

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segunda-feira, 22 de novembro de 2010

País emparedado

Esta foi a leitura inteligente e oportuna feita por um amigo à fotografia que lhe enviei.



«Tal como esta excelente fotografia o novo país está emparedado e num caminho tortuoso sem fim à vista

E eu permito-me acrescentar:

“emparedado entre a corrupção e a ganância sem limites. O caminho seremos nós a desbravar”.

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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

BALADA DOS CÃOTRIBUINTES



Balada dos Cãotribuintes

Somos nós os desventurados

Os pobres contribuintes
Obrigados a sofrer até ao fim dos tempos
A
sorte a que imper
A
que imperturbáveis
Nos condenam os nossos go
Todos os nossos governos
Se
meteres cem francos de gasolina
Oitenta
vão para o Estado
Olha cheio de concupiscência
Os Cadillac...
Olha pra outro lado
No
teu dois cavalos de brincar
Saltita ao
longo dos caminhos
É uma
sorte poderes circular
Amanhã vão-to proibir
Taxa sobre o álcool e a cerveja
Sobre os definitivos e os provisórios
Sobre o triste celibatário
Castigado
por ser um
Controlam-te
todos os passos
Ah compraste
um belo naco
Tudo corre às mil maravilhas
Paga guloso paga prò saco

Refrão

Numa
bandeja o Estado dá-te
Um prato... apanhas um desgosto
Está
vazio E tu admiras-te
Mas é o prato do imposto
Tu passeias pela vida
De
peito feito cheio impante
Cuidado com o imposto sobre a energia
É
para ontem... ou mesmo antes
Um belo dia sobre o oxigénio
Ligar-te-ão o
contador
Tarifa simples o ar do Sena
Tarifa dupla o ar da serra
Eis porém que tu te fartas
Preferes
andar aos caídos
Ou tornar-te engolidor de facas...
Taxa de engolidor acrescentada

Refrão

Um remédio o casamento
Dizes de
súbito e corres
A
procura de uma rapariga séria
Que saiba de amor e de comes
Apressas-te e calculas
Que ao fim de doze filhos o abono
Do
teu rendimento minúsculo
Compensará a
escassez
Mas um inspector das Finanças
Põe-se a
badalar a ideia
E pare...
sem dor por minha
Um texto cheio de veia
Então a Câmara classifica-te
Como garanhão de cobrimento
Medem-te e tens a
mais
Pagas taxa sobre o comprimento

Refrão

Se pagasses
para alguma coisa
Sempre tinhas uma justificação
Mas infeliz daquele que ousa
Perguntar pr'onde vai o cifrão
Temos
estradas miseráveis
Nãoescolas mas padres
Acabou o
bom vinho há carrascão
Mas fornecem-nos o puré
O
governo da França
Republicano —
ou que assim diz que é —
um prato oferece com abastança
O
frango... pilim para o arroz
E
para evitar a falência
Dos
pobres vendedores de canhões
Faz-se uma
guerra do para a mão
A
guerra não se diz que não...

Mas nós os pobres cães os pobres contribuintes
Virá
um dia em que de pau em punho
Nos consolaremos a limpar o redil
Onde os nossos seiscentos porcos estão maduros para o enchido

Boris Vian, in "Canções e Poemas"
Tradução de Irene Freire Nunes / Fernando Cabral Martins



terça-feira, 19 de outubro de 2010

Viúvo do mundo - Otto René Castillo



Viúvo do mundo

Camaradas

eu cumpro o meu papel

lutando

com o que tenho de melhor.

Que pena ter tido

vida tão curta,

para tragédia tão grande

e para tanto trabalho.

Não lastimo deixar-vos.

Convosco fica a minha esperança.

Sabem,

gostaria de

ter chegado ao fim

de todas estas canseiras

convosco,

no meio de tão alto júbilo.

Imagino-o

e não queria partir.

Mas sei, obscuramente

Diz-me o sangue,

Com sua tímida voz,

Que em breve

Ficarei viúvo do mundo.

Otto René Castillo


Viudo del mundo

Compañeros míos

yo cumplo mi papel

luchando

con lo mejor que tengo.

Que lástima que tuviera
vida tan pequeña,
para tragedia tan grande
y
para tanto trabajo.

No me apena dejaros.

Con vosotros queda mi esperanza.

Sabeis,

me hubiera gustado

llegar hasta el final

de todos estos ajetreos

con vosotros,

en médio de júbilo

tan alto. Lo imagino

y no quisiera marcharme.
Pero lo
, oscuramente
me lo dice la sangre
con su
tímida voz,
que muy pronto
quedaré viudo del
mundo.

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terça-feira, 5 de outubro de 2010

Dinis H. G. Nunes - SMS AO CHICO BUARCOS DA BRASILÂNDIA



SMS AO CHICO BUARCOS DA BRASILÂNDIA

sei
que não estás em festa,
e é uma
pena,
tanto mar, tanto mar
e ficámos
tão atados ao cais do sodré
que caímos na real
agarrados a um ramo seco na rua do alecrim

diz-me chico,
quem tem medo de navegar?
quem meteu medo à gente?
quem nos tirou a terra toda
furtou-nos
fortuito o sonho virtual
e
agora ficámos sem-mar?

nós navegadores atrevidos do medo
cavaleiros da terra-santa
templários de avís rent-a-car
em demanda do santo graal
bandeirantes dos confins da utopia
nós queremos é uma pátria perdida nunca vista
sob um Império de sangue, sal e conquista
nasça
um montemor-novo-além-tejo em mato-grosso
e se cumpra
um grande putogalp, !

Dinis H. G. Nunes

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domingo, 3 de outubro de 2010

Palavras fundamentais - Nicolás Guillén


Nicolás Guillén

Palavras fundamentais

Faz com que a tua vida seja
sino que repique
ou sulco onde floresça e frutifique
a
árvore luminosa da ideia.
Alça a tua voz sobre a voz sem nome
de
todos os demais, e faz com que ao lado
do
poeta se veja o homem.

Enche o
teu espírito de lume;
procura as eminências do cume
e, se o
esteio nodoso do teu báculo
encontrar algum obstáculo ao teu intento,
sacode a
asa do atrevimento
perante o atrevimento do obstáculo.

(Tradução de Albano Martins)