POEMA DA PERGUNTAÇÃO
Não somos todos, os envergonhados, os verdadeiros culpados?
Não somos nós, os indignados, os verdadeiros carrascos?
O que
antes e agora
julgamos, não foi apenas
uma pequena evidência?
O que nós
prendemos não foi a mão
obscura de uma consciência?
E mesmo o que
matamos, não foi tão- somente
uma ínfima parte
da verdade?
E procuramos grades?
E procuramos muros altos
e seguros? E procuramos homens obtusos para que os possamos vigiar? E procuramos armas
para os tornarmos intransponíveis?
De nada nos
valerá, de nada nos
adiantará. Não há ferro,
nem betão,
nem servilismo
nenhum que
nos possam salvar
da luz da verdade.
Uma mentira
não tem sempre
sede de liberdade?
Uma mentira não
é a cela da verdade?
E quantas vezes a pretendemos prender? E com
quantas grades a desejamos ocultar? E com
quantas mãos a ameaçamos estrangular?
Não vale a pena.
Desistamos. Em nenhum
maciço de betão
podemos esconder o que
a nossa consciência
sabe. Em nenhuma anedota,
em nenhum
boato, em
nenhuma suposição, em
nenhuma imparcialidade e em nenhum juiz e em nenhum desmentido
nos jornais
e em nenhum
país. Nem
de nós, nem
dos outros.
Eduardo White
1963-2014
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