sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Os varredores - Cecília Meireles



Os varredores

Por baixo dos largos fícus
plantados à beira-mar,
em redor dos bancos frios
onde se dita o luar,
vão passando os varredores,
calados, a vassourar.
Diríeis que andam sonhando,
se assim o vísseis passar,
por seu calmo rosto branco,
sua boca sem falar,
- e por varrerem as flores
murchas, de verem amar.

E por varrerem os nomes
desenhados par a par,
no vão desejo dos homens,
na areia ao pisar...
- por varrerem os amores
que houve naquele lugar.
Visto de baixo, o arvoredo
é renda verde luar,
desmanchada ao vento crespo
que à noite regressa ao mar
vão passando os varredores
vão passando e vão morrendo
a terra, a lembrança, o tempo.

E de momento em momento,
varrem seu próprio passar.


Cecília Meireles
(1901-1964)

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