Último poema para Elina
Este é tempo de divisas,
tempo de gente cortada.
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
As nossas bocas já não tecem
com a mesma pureza
o mundo novo que sonhámos
Elina
Agora na claridade incerta do dia
recordo
que recordar o belo é já
rasgar um pouco a casca do futuro
Nem sempre nossos passos percorreram
o caminho imprescindível
cem vezes as palavras se esqueceram
de acender sobre o rosto da terra
a flauta da paz e da alegria
Nosso tempo Elina
é tempo de divisas
tempo de labirintos e de sombras:
nem sempre descobrimos a saída
necessária a luz reveladora
nem sempre o nosso olhar levou aos outros
a proibida mensagem de longínquas searas
Nosso tempo Elina
é tempo de contradições
tempo de gente cortada
Porém o que fizemos
vive cresceu
liberto nas esquinas da cidade
Recordêmo-lo pois antes de partir
sem lágrimas Elina
jamais nossas bocas tecendo
com a mesma pureza
o mundo novo que sonhámos
mas fiéis à primeira promessa
Em sua rota pessoal cada um colocará
pedra sobre pedra
esforço sobre esforço
– porque este é tempo de divisas
tempo de gente cortada
mas dentro dele já cresce
a semente inviolada
onde o futuro floresce
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