Eu quero ser D. Quixote –
Vou desfiando o rosário
dos anos que vão passando.
Viro a folha ao calendário:
doze meses me esperando
acalentam novos sonhos
com dias bem mais risonhos
que os que se foram gastando
na escalada da Vida
em que sempre fui teimando.
As cores com que me acenam,
as promessas de bonança,
não serão peças que encenam
no Teatro da Esperança?
Não será o Novo Ano
mais três actos de ilusões
nesta comédia de engano
que traz, ao cair do pano,
consigo mais frustrações?
Sei que parto em desvantagem
imitando D. Quixote
pra esta incerta viagem
em busca de melhor sorte,
sei que a força é desigual
lutando contra a voragem
dos que se aliam ao Mal
para obterem vantagem.
Mas hei-de encontrar coragem
para saber distinguir
nos mistérios dos caminhos
as visões alucinantes
com que me irão confundir:
― o que vejo são gigantes
que me tentam iludir
ou não passam de moinhos?
Vou evitar enredar-me
nas malhas de nova teia
e fugir para furtar-me
ao desejo que estonteia
de, parado, extasiar-me
nesse canto de sereia
que tentará afogar-me
roubando-me a Dulcineia.
Se quero Sancho ao meu lado
é porque a sua sageza
é o saber validado
pela própria Natureza:
é saber equilibrado
a suster o desvario
chamando-me à razão
quando dela me desvio.
Rocinante há-de ensinar-me
nessa doce pacatez
a caminhar devagar:
– cada passo em sua vez.
E nessa sabedoria
que só a idade acrescenta
descobriremos a via
de que a Vida se alimenta.
Seguirei, pois, os caminhos
(por vezes os mais distantes)
que me segrede a Razão.
Que eu prefiro ver moinhos
e dar combate aos gigantes
que me toldam a visão.
Se há algo que me alicia
a tomar a decisão
de frente e de forma audaz
é não crer que é utopia
dar aos outros minha mão
para alcançarmos a Paz.
Nesta crença me renovo
E me torno inda mais forte:
Quero mesmo um ano NOVO!
EU QUERO SER D. QUIXOTE!
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