domingo, 7 de novembro de 2021

CASEBRE - JORGE BARBOSA

 

CASEBRE

 

Foi a estiagem

E o silêncio depois

Nem sinal de planta
nem restos de árvore
no cenário ressequido da planície.

O casebre apenas

de pedra solta

e uma lembrança aflitiva

 

O teto de palha

levou-o

a fúria do sueste.

 

Sem batentes

as portas e as janelas

ficaram escancaradas

para aquela desolação.

 

Foi a estiagem que passou.

 

Nesses tempos

não tem descanso

a padiola mortuária da regedoria.

 

Levou primeiro

o corpo mirrado da mulher

com o filho nu ao lado

de barriga inchada

que se diria

que foi de fartura que morreu.

O homem depois

com os olhos parados

abertos ainda.

 

Tão silenciosa a tragédia das secas nestas ilhas!

Nem gritos nem alarme

— somente o jeito passivo de morrer!

 

No quintal do casebre

três pedras juntas

três pedras queimadas

que há muito não serviram.

 

E o arco do ferro do menino

com a vareta ainda presa.

 

JORGE BARBOSA

Ilha do Sal, 23 de Dezembro de 1966

 

Sem comentários: