“Até logo”
à Isaura
Há oito meses dissemos:
– Até logo!
Era uma tarde fria de Novembro
uma tarde como qualquer outra
gente regressando a casa do trabalho
lancheiras malas rugas profundas no rosto.
Se houvesse malas de mão
para a saudade a desventura
não havia malas no mundo que
[chegassem...
Era uma tarde fria de Novembro.
Não sei se alguém sorriu
do beijo que trocámos.
– Até logo – disseste.
Depois passaram oito meses
os meses mais compridos que tenho
[encontrado.
Que pensamentos levava comigo?
Sei que disseste «até logo»
E era como se levasse as tuas mãos
Abertas sobre o meu peito.
Pensava
que só nas despedidas breves
por horas
se dizia «até logo»
como a alguém que parte
«boa viagem»
ou ao nosso companheiro
«bom trabalho».
Mas já
passaram oito meses
duzentos e quarenta dias
cinco mil e setecentas horas.
Porque disseste
«Até logo»?[
Se eu não
soubesse
aprenderia que na minha pátria
os namorados dizem «até logo»
e estão meses anos
por vezes não voltam mais.
Fecham-nos
atrás de grades de ferro
espancam-nos
matam-nos devagar
e não permitem que apareçam
«logo».
Amiga
o ódio que trago armazenado
destas noite de insónia e abandono
dou-o à luta.
Mas temos que sofrer
sofrer deveras.
Até que um dia
Os homens cantarão livres como
[os pássaros
os namorados
beijarão sem pressa
e as palavras «até logo»
quererão dizer simplesmente
«até logo»[*]
[*] Os oito meses transformaram-se em dez anos. Noutros casos, quinze, vinte
anos e mais.
Em António Borges Coelho. Fortaleza,
Seara Nova, 1974
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