terça-feira, 23 de abril de 2013

Hans Magnus Enzensberger

Hans Magnus Enzensberger



DEFESA DOS LOBOS CONTRA OS CORDEIROS

deve o abutre se alimentar de flores?
o
que exigis do chacal?
que ele mude de pele? e do lobo? que
ele mesmo limpe os dentes?
o
que não apreciais
nos coronéis e nos papas?
o
que vos deixa perplexos
na
tela mentirosa?
quem irá então costurar para o general
a
condecoração sanguinária em sua calça? quem
irá
fatiar o capão diante do agiota?
quem irá ostentar orgulhoso a cruz-de-ferro
diante da barriga que ronca? quem
irá
pegar a gorjeta, a soma,
a
propina? há
muitos roubados, poucos ladrões; quem
então os aplaude? quem
lhes coloca a insígnia? quem
é
ávido pela mentira?
vede no espelho: covardes,
que evitam a fadiga da verdade,
avessos ao aprender, o pensar
é deixado a
critério dos lobos,
a
coleira é vossa jóia mais cara,
nenhuma
ilusão é tão estúpida, nenhum
consolo é tão barato, qualquer chantagem
ainda é para vós branda demais.
cordeiros, irmãs são
as
gralhas comparadas a vós:
cegais uns aos
outros.
a
irmandade reina
entre os lobos:
eles vão em bandos.
louvados sejam os predadores: vós,
convidativos ao estupro,
vos atirais sobre o leito negligente
da
obediência. mentis e ainda
soltais
ganidos. quereis
ser estraçalhados. vós
não mudais o mundo.


Hans Magnus Enzensberger


(Tradução de Afrânio Novaes)

1 comentário:

Rogério G.V. Pereira disse...

Fabuloso,
até no sentido literal do termo