DISCURSO NO MERCADO DO DESEMPREGO
Talvez eu perca — se desejares — a minha subsistênciaTalvez venda as minhas roupas e o meu colchão
Talvez trabalhe na pedreira... como carregador... ou varredor
Talvez procure grãos no esterco
Talvez fique nu e faminto
Mas não me venderei
Ó inimigo do sol
E até a última pulsação de minhas veias
Resistirei
Talvez me despojes da última polegada da minha terra
Talvez aprisiones a minha juventude
Talvez me roubes a herança dos meus antepassados
Móveis... utensílios e jarras
Talvez queimes os meus poemas e os meus livros
Talvez atires o meu corpo aos cães
Talvez levantes espantos de terror sobre a nossa aldeia
Mas não me venderei
Ó inimigo do sol
E até a última pulsação das minhas veias
Resistirei
Talvez apagues todas as luzes da minha noite
Talvez me prives da ternura da minha mãe
Talvez falsifiques a minha história
Talvez ponhas máscaras para enganar os meus amigos
Talvez levantes muralhas e muralhas em meu redor
Talvez me crucifiques um dia diante de espetáculos indignos
Mas não me venderei
Ó inimigo do sol
E até à última pulsação das minhas veias
Resistirei
Ó inimigo do sol
O porto transborda de beleza... e de signos
Botes e alegrias
Clamores e manifestações
Os cantos patrióticos arrebentam as gargantas
E no horizonte... há velas
Que desafiam o vento... a tempestade e franqueiam os obstáculos
É o regresso de Ulisses
Do mar das privações
O regresso do sol... do meu povo exilado
E para os seus olhos
Ó inimigo do sol
Juro que não me venderei
E até à última pulsação das minhas veias
Resistirei
Resistirei
Resistirei
Samih Al-Qassim
(poeta palestiniano proibido de exercer a profissão docente pelos israelitas)
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