Para ler nas férias, e não só.
Que importa a fúria
do mar
«Tersa gente
esta, de almas baldias, vontades torcidas
pelo frio que aperta,
amolecidas pelo sol
que expande. Ando aqui
a ganhar a morte.
Nestes campos de giesta, engatadas
raízes no chão,
tão presas
de seiva e vontade
que não
as pode a força de um
homem arrancar.
Ervas daninhas mais
difíceis de vergar do que
um pinheiro
bravo à machadada.
O pinheiro deixa
o coto apodrecido,
vã ruína orgânica,
mas as raízes das giestas mantêm-se
sorrateiras, infiltrantes, debaixo da terra, a aguardar melhor ocasião para levantar haste. E, mal um homem vira costas, lá estão elas, sob os pés,
soturnas, insinuantes, sôfregas de todas
as pingas de água,
a saciarem-se, a exaurirem as lavouras, sem sequer a gentileza de uma sombra,
só pasto de insetos, refúgio
de furões, conspiração
do matagal. Assim
ando eu. Entre
mato rasteiro
e bravio. Que
a vida sempre
me foi um
ferro de engomar.
Quando há um
prego que
se destaca, martela-se. E no entanto, mesmo amolgado e enterrado, continua lá.
De quem
é o carvalhal?
Ando aqui
a ganhar a morte. A
vergar-me a cada passo,
nesta rabugem vegetal,
com involuções
de ouriço-cacheiro. Se me tocam, eu
abro pico em
todas as frentes. Que
eu nunca
pedi nada. Nunca
encomendei sermão. Nunca
enclavinhei a mão par
dar um….»
1ª
página do romance,
Que Importa a Fúria
do Mar
de
Ana Margarida de Carvalho.
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