(9/11/1918 - 5/12/2012)
A Vascode Magalhães-Vilhena
Com um surdo rumor de escavadora ressoa no subsolo a tua voz. Muitos tapam os ouvidos delicados. Outros escondem-se para a não ouvir. E outros estremecem de pavor. Mas, rápidos, os ciclistas pedalam na bruma dos subúrbios ao teu encontro. Rosto baixo, mãos no guiador, pés bem firmes nos pedais, geram o movimento, o ritmo alado das máquinas frágeis que cavalgam ao amanhecer. Perpassam como espectros sob a bruma e juntam-se, confluem, avançam como um rio poderoso sobre a cidade adormecida. Os ciclistas. Os que erguem os andaimes E fazem girar os fusos dos teares. Os que movem as gruas. Os que transportam O dinamite nas mãos calosas. Os que não sabem envelhecer de tédio à mesa do café nem vivem de mercadejar preservativos, palavras, casas pré-fabricadas. Os que não sonham morrer em glória como jovens deuses trespassados na batalha. Os que não hão-de apodrecer, como muitos de nós, roídos de lepra e desespero. Esses merecem bem a tua voz, Orfeu. PAPINIANO CARLOS in: “A ave sobre a cidade”, 1973 |
Sem comentários:
Enviar um comentário