quarta-feira, 23 de maio de 2018

Também o que é Eterno - Manuel Resende

Também o que é Eterno


Também o que é eterno morre um dia.

Eu tusso e sinto a dor que a tosse traz;

O doutor quer por força a ecografia,

Mas eu não estou pra tantas precisões.


Eu rio à morte com um riso largo:

Morrer é tão banal, tão tem que ser!

Disto ou daquilo, que me importa a mim?

Mas, ó horror, com fotos, não, nem documentos!


A tanta exactidão mata o mistério.

O pH, o índice quarenta...

Não quero as pulsações, os eritrócitos,

O temeroso alzaimer, ou o cancro,

Nem sequer o tão raro, do coração.


Ver o pulmão, o peito aberto, o coração,

A palpitar a cores no computador?

Eu morro, eu morro, não se preocupem,

Mas sem saber, de gripe, ou duma coisa,

Ou doutra coisa.





Manuel Resende

Sem comentários: