SEIS DE AGOSTO
Podemos esquecer esse clarão?
de súbito 30.000 desapareceram das ruas
esmagados nas profundezas da escuridão
os gritos de 50.000 extinguiram-se
quando os remoinhos de fumo amarelo se dissiparam
edifícios destruídos, pontes desabadas
comboios repletos ficaram calcinados
e uma indeterminada acumulação de escombros e brasas - Hiroshima
pouco depois, uma fila de corpos nus caminhando em grupos, chorando com a pele pendurada como farrapos
mãos no peito
pisando massa cerebral desintegrada
roupa queimada cobrindo os quadris.
Corpos jazendo por terra como estátuas de pedra de Jisô, espalhados em toda as
direções
nas margens do rio, deitados uns sobre os outros, um grupo que se havia arrastado até
uma balsa
pouco a pouco transformou-se em cadáveres sob abrasadores raios de sol
e sob a luz das chamas que atravessaram o céu ao entardecer
o lugar de onde mãe e o irmão mais novo foram esmagados vivos
e engolidos pelas chamas
e quando pela manhã o sol brilhou sobre um grupo de alunas do colégio
que haviam fugido, estavam estendidas sobre excremento na estrebaria
ventres inchados, um olho esmagado, metade dos corpos em carne viva com a pele descolada e sem cabelo,
sem se poder dizer quem era quem
tudo havia deixado de se mover
um cheiro desagradável e agressivo
o único som as asas das moscas zumbindo à volta de bacios metálicos
cidade de 300.000
podemos esquecer esse silêncio?
nessa quietude
a poderosa atração
das órbitas vazias das esposas e filhos que não regressaram a casa
e nos despedaçou o coração
pode ser esquecido ?!
TŌGE Sankichi (1917 - 1953) foi um poeta japonês, ativista e sobrevivente do bombardeio atómico de Hiroshima. O livro “Poems of the Atomic Bomb” foi publicado em 1951. Por Karen Thornber que recebeu o Prêmio Sibley 2011 da Universidade de Chicago pela tradução.
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