segunda-feira, 30 de outubro de 2017

PAI NOSSO - Nicanor Parra



PAI NOSSO

Pai nosso que estás no céu
Cheio de todo tipo de problemas
De cenho franzido
Como se fosses um homem vulgar e comum
Não penses em nós.

Compreendemos que sofres
Porque não podes consertar as coisas.
Sabemos que o Demónio não te deixa tranquilo
Desconstruindo o que constróis.

Ele se ri de ti
Mas nós choramos contigo:
Não te preocupes com suas risadas diabólicas.

Pai  nosso que estás onde estás
Rodeado de anjos desleais
Sinceramente: não sofras mais por nós
Tens de perceber
Que os deuses não são infalíveis
E que nós perdoamos tudo.

Nicanor Parra


PADRE NUESTRO

Padre nuestro que estás en el cielo
Lleno de toda clase de problemas
Con el ceño fruncido
Como si fueras un hombre vulgar y corriente
No pienses más en nosotros.

Comprendemos que sufres
Porque no puedes arreglar las cosas.
Sabemos que el Demónio no te deja tranquilo
Desconstruyendo lo que tú construyes.

Él se ríe de ti
Pero nosotros lloramos contigo:
No te preocupes de sus risas diabólicas.

Padre nuestro que estás donde estás
Rodeado de ángeles desleales
Sinceramente: no sufras más por nosotros
Tienes que darte cuenta
De que los dioses no son infalibles
Y que nosotros perdonamos todo.

domingo, 29 de outubro de 2017

Amanhã - EDUARDO GALEANO

(foto de Sebastião Salgado – família deixando mina no Amazonas)

Amanhã

Há um único lugar
onde ontem e hoje
se encontram
e se reconhecem
e se abraçam.

Esse lugar é amanhã.

 (Uruguai, 1940) Tradução de Jeff Vasques

Mañana

Hay un único lugar

donde ayer y hoy

se encuentranye se reconocen

y se abrazam.

Esse lugar es mañana.

Metalúrgica - Oswald de Andrade

Metalúrgica

1300° à sombra dos telheiros retos
12000 cavalos invisíveis pensando
40 000 toneladas de níquel amarelo
Para sair do nível das águas esponjosas
E uma estrada de ferro nascendo do solo
Os fornos entroncados
Dão o gusa e a escória
A refinação planta barras
E lá em baixo os operários
Forjam as primeiras lascas de aço

(1890-1954)



sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Rumo - Alda Lara

Rumo

É tempo, companheiro!
Caminhemos...
Longe, a Terra chama por nós,
e ninguém resiste à voz
Da Terra...
Nela,

O mesmo sol ardente nos queimou
a mesma lua triste nos acariciou,
e se tu és negro e eu sou branco,
a mesma Terra nos gerou!

Vamos, companheiro ...
É tempo!

Que o meu coração
se abra à mágoa das tuas mágoas
e ao prazer dos teus prazeres
Irmão

Que as minhas mãos brancas se estendam
para estreitar com amor
as tuas longas mãos negras...
E o meu suor
se junte ao teu suor,
quando rasgarmos os trilhos
de um mundo melhor!

Vamos!
que outro oceano nos inflama...
Ouves?
É a Terra que nos chama ...
É tempo, companheiro!
Caminhemos...

Alda Lara 

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

RECADO AOS APRESSADOS

“Não existe um todo predeterminado final, a que tenhamos de “chegar”, nem um tempo e um caminho já fixados para isso; vai sendo delineado entre os diversos actores populares com a sua participação, os seus ritmos e os seus tempos. O todo é sempre as partes, está latente em cada uma delas e existe nos modos concretos da sua articulação em cada momento.”
Isabel Rauber

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

MINHA CASA E MEU CORAÇÃO - Marcos Ana

MINHA CASA E MEU CORAÇÃO
(Sonho de liberdade)

Se saio um dia à vida
minha casa não terá chaves:
sempre aberta, como o mar,
e o sol e o ar.

Que entrem a noite e o dia,
e a chuva azul, a tarde,
o rubro pão da aurora;
A lua, minha doce amante.

Que a amizade não detenha
seus passos em meus umbrais,
nem as andorinhas em seu vôo,
nem o amor seus lábios. Ninguém…

Minha casa e meu coração
nunca fechados: que entrem
os pássaros, os amigos,
o sol e o ar.

 Marcos Ana
Poemas do cárcere

sábado, 21 de outubro de 2017

Da terra - Manuel Rui

Da terra
… era a minha sementeira
se eu tivesse a mesma sina
que aproveita a goiabeira

de semente pequenina
começou por ser verdinha
mas depois se avermelhou

depois
a passarada
chilreando à liberdade descuidada
leva no bico a goiaba
que a goiabeira gerou

Manuel Rui