terça-feira, 30 de abril de 2013

Meu Maio



Meu Maio
A todos
que saíram às ruas
de corpo-máquina
cansado,
A todos
Que imploram feriado
às
costas que a terra extenua –
Primeiro de Maio!
Meu mundo, em primaveras,
derrete a
neve com sol gaio.
Sou
operárioeste é o meu maio!
Sou camponêsEste é o meu mês.
Sou
ferroeis o maio que eu quero!
Sou terra – O maio é minha era!
Vladimir Maiakovski

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Escrito a vermelho - Albano Martins

Escrito a vermelho
Também ainda não disseste
(e é
bom que o faças antes que anoiteça )
que foi ao serviço duma causa que vieste.
Não lhe dirás o nome, nem é preciso, julgo eu.
Basta que se saiba que foi com sangue que
sempre o escreveste. E bastará, por isso, que
leiam os
teus versos. Porque em todos eles está
escrito a vermelho.
Albano Martins

domingo, 28 de abril de 2013

Memória do primeiro de maio

Memória do primeiro de maio

Um país iluminado por ruínas nunca repousadas
Em teus olhos cegos subitamente
Rasgados /
um país distendido
Entre velhas colónias emancipadas
No
ardor da guerra / um povo libertando se
Do
seu ovo de silêncio amor cifrado & usura
Tubérculo apodrecido
D’
onde foi banido
O
dente cariado da ditadura…………………………………

O
mar foi o mar na praça pública a luxuriante
Vegetação / a festa solar / a luz crua
Do
exílio e da morte / o espectáculo
De
um povo (águas
D’
abril) a quem foi devolvido
O
dom da fala / a mística
Da
revolução. Ouve se
Por toda a cidade
O
grande coral da liberdade…………………………………
Objectos de culto & personal


Casimiro de Brito

sexta-feira, 26 de abril de 2013

“os eunucos”




 os eunucos
Os eunucos devoram-se a si mesmos
Não mudam de uniforme, são venais
E quando os mais são feitos em torresmos
Defendem os tiranos contra os pais

Em tudo são verdugos mais ou menos
No jardim dos haréns os principais
E quando os mais são feitos em torresmos
Não matam os tiranos pedem mais


Suportam toda a dor na calmaria
Da olímpica visão dos samurais
Havia um dona a mais na satrapia
Mas foi lançado à cova dos chacais

Em vénias malabares à luz do dia
Lambuzam da saliva os maiorais
E enquanto os mais são feitos em fatias
Não matam os tiranos pedem mais
 Zeca Afonso

terça-feira, 23 de abril de 2013

Hans Magnus Enzensberger

Hans Magnus Enzensberger



DEFESA DOS LOBOS CONTRA OS CORDEIROS

deve o abutre se alimentar de flores?
o
que exigis do chacal?
que ele mude de pele? e do lobo? que
ele mesmo limpe os dentes?
o
que não apreciais
nos coronéis e nos papas?
o
que vos deixa perplexos
na
tela mentirosa?
quem irá então costurar para o general
a
condecoração sanguinária em sua calça? quem
irá
fatiar o capão diante do agiota?
quem irá ostentar orgulhoso a cruz-de-ferro
diante da barriga que ronca? quem
irá
pegar a gorjeta, a soma,
a
propina? há
muitos roubados, poucos ladrões; quem
então os aplaude? quem
lhes coloca a insígnia? quem
é
ávido pela mentira?
vede no espelho: covardes,
que evitam a fadiga da verdade,
avessos ao aprender, o pensar
é deixado a
critério dos lobos,
a
coleira é vossa jóia mais cara,
nenhuma
ilusão é tão estúpida, nenhum
consolo é tão barato, qualquer chantagem
ainda é para vós branda demais.
cordeiros, irmãs são
as
gralhas comparadas a vós:
cegais uns aos
outros.
a
irmandade reina
entre os lobos:
eles vão em bandos.
louvados sejam os predadores: vós,
convidativos ao estupro,
vos atirais sobre o leito negligente
da
obediência. mentis e ainda
soltais
ganidos. quereis
ser estraçalhados. vós
não mudais o mundo.


Hans Magnus Enzensberger


(Tradução de Afrânio Novaes)

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Aquilino Ribeiro

«lembrar Aquilino no cinquentenário da sua morte»
 

Naquela mata ninguém mata
A pata que vem ali.
Com as suas patinhas de pata
Pata acolá, para acoli.

Pata que gosta de matas
Visita as matas vizinhas,
Com as suas duas patas
Seguida de dez patinhas.

E cada patinha tem
Tal como a pata daquela mata
Duas patinhas também
Que são patinhas de pata.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Aço na forja… - Carlos de Oliveira


Aço na forja

Aço na forja dos dicionários
as palavras são feiras de aspereza:
o primeiro vestígio de beleza
é a cólera dos versos necessários.


Carlos de Oliveira
                          (in: Mãe Pobre)


sábado, 13 de abril de 2013

Álvaro de Campos

Cesário, que conseguiu

Cesário, que conseguiu
Ver claro, ver simples ver puro,
Ver o mundo nas suas coisas,
Ser um olhar com uma alma por trás, e que vida tão breve!
Criança alfacinha do Universo.
Bendita sejas com tudo quanto está à vista!
Enfeito, no meu coração, a Praça da Figueira para ti
E nãorecanto que não veja para ti, nos recantos de seus recantos.
Álvaro de Campos

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Quem… - João Apolinário

Quem

Quem tem a consciência para ter coragem
Quem tem a força de saber que existe
e no centro da própria engrenagem
inventa a contra-mola que resiste


Quem não vacila mesmo derrotado
Quem perdido nunca desespera
e envolto em tempestade decepado
entre os dentes segura a primavera.


João Apolinário