segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

ANO NOVO - Ferreira Gullar

ANO NOVO

Meia-noite. Fim
de um ano, início
de outro. Olho o céu:
nenhum indício.

Olho o céu:
o abismo vence o
olhar. O mesmo
espantoso silêncio
da Via-Láctea feito
um ectoplasma
sobre a minha cabeça:
nada ali indica
que um ano novo começa.

E não começa
nem no céu nem no chão
do planeta:
começa no coração.

Começa como a esperança
de vida melhor
que entre os astros
não se escuta
nem se vê
nem pode haver:
que isso é coisa de homem
esse bicho
                   estelar
                   que sonha
                   (
e luta). 

Ferreira Gullar
Toda poesia. Rio de Janeiro: José Olímpio, 1997.

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