sexta-feira, 16 de julho de 2021

Os julhos… - Daniel Abrunheiro

 

Os julhos…

I

    Os julhos foram-se embora como comboios sem volta.

    Nem freixos sentinelam já o canal, esse mesmo a que vinham beber as leiras, animais horizontais povoando o deserto.

    Onde a pessoa não é, é o deserto:

    o pior deserto é porém o pessoal, aí onde se fica

    sem reflexo nem reflexão.

    Cândido diz-nos:

    – Quem janta vinho, almoça água.

    É o Povo a falar por boca-língua-dentes dele, pobre rapaz.

    Enerva-se Nilo:

    – A estupidez é a mais viçosa das ervas-daninhas.

    Mas não é contra Cândido que se enerva ele, sim contra o predomínio dos idiotas-da-turma subidos à ponte-do-navio.

    E insiste:

– A burrice é capaz de encher a oficina do sapateiro e os museus todos às segundas-feiras.

    Mas o que deveras o exaspera é cada maçã reiterar em si a condição de desdentado, não pode, há já muitos anos, morder a bela pêra-de-inverno da avoenga quinta, pois que à natural ferradura dental sucedeu a coroa acrílica – e, aos olhos, cus-de-garrafa deformando em fundo-de-poço a curvatura ex-arcoiridescente da nitidez juvenil.

    É úrgica & cirúrgica a cura do vinho pelo chá, do absinto pela tangerina espremida.

    Ai os julhos, esses desavindos connosco julhos!

 

Daniel Abrunheiro

[continua AQUI]

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Quinta-feira

15 de Julho de 2021

 

 

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