sexta-feira, 15 de abril de 2016

Opiparus, Cena XI de Pátria: - Guerra Junqueiro

Cena XI de Pátria(aqui):

Opiparus:


A fome e a dor bramem de noite, uivam nas eiras?
Matinadas, clarins, vivas ao rei, bandeiras.
Alegria! gozar! folgar! nada de luto!
Bombas! Salvem canhões de minuto a minuto!
E a cada grito de miséria ou de estertor
O cantar dum Te-Deum e o rufar dum tambor.
Dê-se à plebe faminta uma estrondosa orgia,
Um banquete real, monstro, - em scenografia!
Que bela idéa! Armar de improviso um galeão,
- Tábuas, cinábrio, gêsso, andrinopla e cartão,
- Pô-lo em rodas, tirado a parelhas d'Alter,
A Côrte dentro, o patriarca, o chanceler,
El-rei de c'roa d'oiro, a rainha taful
Asas novas de arcanjo, uma branca outra azul,
Eu ao leme, pendões, músicas, auriflamas,
Bispos e generais, o núncio, arautos, damas,
Com brilhantes a arder em veludo e em brocado
- Tripulação emfim de baixel encantado,
A navegar de rua em rua, e praça em praça,
Atirando à miséria, à nudez, à desgraça,
A carga inteira a plenas mãos: lôdo em confeitos,
Gargalhadas, sermões de entrudo (alguns perfeitos!)
Drogas de charlatães, ditos de saltimbanco,
Cinza, areia, impudor, fome... e notas de banco!
..................................................................
E por último a rir sentamo-nos à mesa,
A despejar champagne em favor da pobreza!

 Guerra Junqueiro

1 comentário:

Diana Fonseca disse...

Não conhecia, confesso. Mas fiquei encantada.