quarta-feira, 15 de maio de 2019

Os muros - Jacinta Passos



Os muros

Minha cidade tem muros
de pedra, cimento e cal
tem muros que são tribunas,
painéis, cartilha e coral. 

Quem de noite faz as letras

que aparecem de manhã?

Será a mão do poeta

ou a mão da tecelã?

Viva Luiz Carlos Prestes!
O petróleo é nosso!

Fora com os americanos!

A polícia apaga e as letras

aparecem de manhã.
Será a mão do poeta
ou a mão da tecelã?

Minha cidade tem muros
brancos, cinzentos, de cores,

riscos de piche e carvão,

ó, pintores, vinde ver!

Vinde ler a história escrita
nos muros, cada manhã.
Será a mão do poeta
ou a mão da tecelã?

(São Paulo, 1953)   
Este poema, publicado no Suplemento Cultural do jornal comunista “Imprensa Popular“ em  25/07/1954, até agora jamais havia sido republicado. Ele me foi gentilmente enviado pelo pesquisador João Nascimento, a quem muito agradeço.
“Os Muros” foi escrito por Jacinta Passos em 1953, ano em que voltou a ser internada na Clínica Psiquiátrica Charcot, em São Paulo, onde já estivera no ano anterior, as duas vezes com o diagnóstico de esquizofrenia paranoide. Não se sabe se Jacinta compôs este poema durante sua segunda internação no Charcot (quando comprovadamente redigiu o longo poema "A Coluna", depois publicado em livro), ou durante o período em que morou em casa de sua irmã Dulce Passos, também na capital paulista, entre os dois internamentos. “Os Muros” integra a série de poemas políticos de Jacinta.

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