sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Liberdade - António Borges Coelho

 

07-10-1928  -  17-10-2025
Liberdade

... amo-te de menino
Encontrei-te 
num mundo de operários
na prisão.
É tempo! É tempo!
O nosso Povo sofre
Sai para a rua
Com uma flor na mão!

Janeiro de 1957

quinta-feira, 16 de outubro de 2025

Adriano Correia de Oliveira - Tejo que levas as águas

 

Adriano Correia de Oliveira

9-4-1942 – 16-10-1982

Tejo que Levas as Águas

Tejo que levas as águas
Correndo de par em par
Lava a cidade de mágoas
Leva as mágoas para o mar

Lava-a de crimes espantos
De roubos fomes terror
Lava a cidade de quantos
Do ódio fingem amor

Lava bancos e empresas
Dos comedores de dinheiro
Que dos salários de tristeza
Arrecadam lucro inteiro

Lava palácios vivendas
Casebres bairros da lata
Leva negócios e rendas
Que a uns farta e a outros mata

Leva nas águas as grades
De aço e silêncio forjadas
Deixa soltar-se a verdade
Das bocas amordaçadas

Lava avenidas de vícios
Vielas de amores venais
Lava albergues e hospícios
Cadeias e hospitais

Afoga empenhos favores
Vãs glórias, ocas palmas
Leva o poder dos senhores
Que compram corpos e almas

Das camas de amor comprado
Desata abraços de lodo
Rostos corpos destroçados
Lava-os com sal e iodo

Tejo que levas as águas
Correndo de par em par
Lava a cidade de mágoas
Leva as mágoas para o mar.

Manuel da Fonseca

Uma imagem com Cara humana, vestuário, pessoa, cavalheiro

Os conteúdos gerados por IA podem estar incorretos.

(Santiago de Cacém, 15/10/1911-11/3/1993)
Poeta, romancista, contista e cronista, membro do Grupo Novo Cancioneiro, presidente da Sociedade Portuguesa de Escritores.

 


M
T
G
Y
A função de fala é limitada a 200 caracteres

quarta-feira, 15 de outubro de 2025

COME E DORME - Felix de Athsyde

 

COME E DORME

O pobre lavra a terra (o seu dia é enorme) lavra a fome, a miséria: o rico come e dorme.

O pobre brita a pedra, (pedravida enorme) brita a fome, a miséria: o rico come e dorme.

O pobre amassa o pão. (a sua fome é enorme) Mas, quem que come o pão? O rico. Come e dorme.

Há fome no Brasil (a miséria é enorme) o pobre morre de fome: o rico come e dorme.

O rico faz a guerra (esse lucro enorme) o pobre come bala: o rico come e dorme.

O pobre pede pão (esse crime enorme) o rico dá cadeia: se benze, come e dorme.

O rico come e dorme. O rico dorme e come. Come a comida do pobre. O pobre dorme com fome.

A fome come o pobre porque a fome não dorme. O rico diz: foi Deus. Depois, come e dorme.

O sono cristão: enorme.

Felix de Athsyde

terça-feira, 14 de outubro de 2025

Desistir... - Letícia Lanz

Desistir...

eu já pensei seriamente nisso,

mas nunca me levei realmente a sério;

é que tem mais chão nos meus olhos

do que o cansaço nas minhas pernas,

mais esperança nos meus passos,

do que tristeza nos meus ombros,

mais estrada no meu coração

do que medo na minha cabeça.


Geraldo Eustáquio de Souza (Letícia Lanz)

 

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

O povo - FATMA GALIA


O povo

Era um povo no deserto,

guerrilheiro e ideal.

Era um povo muito unido

que junto tem de lutar,

era um povo muito belo

que amou sempre a liberdade,

era um povo muito digno,

que só defende a verdade,

e agora o Polisario é tudo

Isto e muito mais.

 FATMA GALIA

 El pueblo

 

Era un pueblo en el desierto,

guerrillero e ideal.

Era un pueblo muy unido

que junto ha de luchar,

era un pueblo muy hermoso

que siempre ama la libertad,

era un pueblo muy digno,

que sólo defiende la verdad,

y ahora el Polisario es todo

Esto y mucho más.

 

(De “Lágrimas de un pueblo herido”)

 

 


terça-feira, 7 de outubro de 2025

“Beirute, 1982” - Etel Adnan,

Alguns trechos do poema de Etel, “Beirute, 1982”, para lembrar que estamos furiosos quanto uma tempestade.

“Beirute, 1982”,

Eu nunca acreditei

aquela vingança

seria uma árvore

crescendo no meu jardim

*

      As árvores crescem em todas as direções

O povo palestino também:

 

deslocado

não gosto de borboletas

sem asas,

incapaz de voar,

carregado de amor

pelas suas fronteiras e pela sua

miséria,

 

ninguém pode ficar para trás para sempre

os bares

ou na chuva.

Nós nunca vamos chorar com lágrimas

mas com sangue.

Não será nos cemitérios onde

vamos plantar o grão

nem na palma da minha mão

Estamos furiosos como uma tempestade.

 

Cordialmente,

Vijay


Etel Adnan,

para recordarnos que estamos tan furiosos como una tormenta.

Nunca creí
que la venganza
sería un árbol
creciendo en mi jardín

*

      Los árboles crecen en todas direcciones
El pueblo palestino también:

desplazado
no como las mariposas
sin alas,
incapaz de volar,
cargado de amor
por sus fronteras y su
miseria,

nadie puede estar eternamente tras
las rejas
o bajo la lluvia.

Jamás lloraremos con lágrimas
sino con sangre.

No será en los cementerios donde
plantaremos el grano
ni en la palma de mi mano
Estamos furiosos como una tormenta.

Cordialmente,

Vijay

sábado, 4 de outubro de 2025

ANDEI MUITOS CAMINHOS - António Machado

ANDEI MUITOS CAMINHOS

Andei muitos caminhos,
abri muitas veredas;
Naveguei em cem mares,
e atraquei em cem ribeiras.

Em todas as partes vi
caravanas de tristeza,
soberbos e melancólicos
borrachos de sombra negra,

E pedantes por trás dos panos
que olham, calam, e pensam
que sabem, porque não bebem
o vinho das tabernas.

Diabólicas pessoas que caminham
e vai apestando a terra…

E em todas partes vi
pessoas que dançam ou jogam,
quando podem, e laboram
seus quatro palmos de terra.

Nunca, chegam a um lugar,
perguntam aonde chegam.
Quando caminham, cavalgam
nos lombos de mula velha,

E não conhecem a pressa
nem ainda nos dias de festa.
Onde há vinho, bebem vinho;
onde não há vinho, água fresca.

São boas gentes que vivem,
laboram, passam e sonham,
e em um dia como tantos,
descansam debaixo da terra.

António Machado

(outra versão)

Tenho andado muitos caminhos

Tenho andado muitos caminhos
tenho aberto muitas veredas;
tenho navegado em cem mares
e atracado em cem ribeiras

Em todas partes tenho visto
caravanas de tristeza
orgulhosos e melancólicos
borrachos de sombra negra.

E pedantes ao pano
que olham, calam e pensam
que sabem, porque não bebem
o vinho das tabernas

Má gente que caminha
e vai empestando a terra...

E em todas partes tenho visto
pessoas que dançam ou jogam,
quando podem, e lavoram
seus quatro palmos de terra.

Nunca, se chegam a um lugar
perguntam a onde chegam.
Quando caminham, cavalgam
lombos de mula velha.

E não conhecem a pressa
nem mesmo nos dias de festa.
Onde há vinho, bebem vinho,
onde não há vinho, água fresca.

António Machado