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ELOGIO DA TERCEIRA COISA
Entre mim e ti há a terceira coisa
aquela que nos põe ao alcance da mão
os nomes todos das coisas e as coisas sem nome
quando a multidão sagrada dos pronomes pessoais nos
permitir dizer nós
contra o tempo e o vento
Nós que aos
cinco sentidos acrescentamos os outros
Nós a
sensibilidade que imagina o comum
quando uma multidão deixa de ser
um rebanho de escravos para começar a ser
uma assembleia de humanos livres
de pé no chão da terra discutimos o que fazer
pelas mãos em concha bebíamos a água
onde a luz do sol cintila irisando-a
Nós que para além de ti e de mim somos
A terceira coisa : a promessa sem garantias
a invenção do incomum que partilha o comum
o comunismo que vem connosco
e para além de
nós recomeça.
A foz em Delta
Três Poemas
Em Memória de
Álvaro Cunhal
A poesia pode ser uma forma de resistência
Pode sê-lo. Sempre, por definição, ou seja, em
determinados contextos, sociais, políticos, culturais.
Hoje, em algum dos lugares em que a história da
modernidade de longa duração continua a vir e a inscrever-se nos tempos, alguma
poesia continua a resistir. Ela resiste à quantidade de barbárie que em cada
tempo insiste. Ela lê em cada tempo quais as ameaças e, consoante o seu teor, o
seu perigo, por um lado e, por outro lado, o seu modo de oposição e o desejo
que trabalha a sua poética, ela responderá. Ela preserva, assim, aberto ao
humano, o reino da possibilidade e das transformações.
Dizer que a poesia resiste é afirmar que ela é uma
específica resistência à sua completa apropriação pela mente ou pelo espírito.
É pensar a materialidade do seu fazer (poiesis e poiema),
retirando-a do campo de acção de qualquer política do espírito.
Manuel Gusmão
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