O MEU MAIOR MEDO
O meu maior medo
é o de transformar-me em “uma poeta”…
Ficar trancada no quarto
olhando o mar
e esquecer…
Medo de que os pontos em minhas veias cicatrizem
e que, em vez de ter uma vaga memória dos noticiários de TV,
eu passe a rabiscar papéis e vender “meus pontos de vista”…
Medo de que os que passaram por cima de nós possam me aceitar
para poderem me usar.
Medo de que meus gritos virem um murmúrio
para fazer o meu povo dormir.
Medo de aprender a usar métrica e ritmo
e ficar presa dentro deles
ansiando que meus versos se tornem canções populares.
Medo de vir a comprar binóculos para ver de perto
as ações de sabotagem das quais não estarei participando.
Medo de cansar-me — uma presa fácil para padres e acadêmicos —
e com isso transformar-me em uma mulherzinha covarde
Eles têm seus métodos…
Podem utilizar a rotina com que nos acostumamos,
já nos transformaram em cães:
nos deram a vergonha por não trabalhar…
depois o orgulho por estarmos desempregados…
É assim que é.
Psiquiatras astutos e policiais deploráveis
esperam por nós nas esquinas.
Marx…
É outro medo
Eu não o esqueço também…
Esses filhos da puta … a culpa é toda deles…
Eu não consigo — merda — nem terminar de escrever isso
Talvez… hum?… talvez um outro dia…
Katerina Gógou
(1940-1993) foi uma poeta grega anarquista e figura representativa do
radicalismo político e da cena cultural dos anos 1980 em Exarchia. Katerina
nasceu em Atenas e os primeiros anos de sua vida foram marcados pela fome, a
ocupação nazista, a resistência e a guerra civil. Participou de mais de 30
filmes gregos. Sua poesia de forte impacto está fincada na condição humana e na
rebeldia revolucionária de conteúdo anarco-comunista. Katerina cometeu suicídio
aos 53 anos com overdose de barbitúricos.
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