quinta-feira, 13 de julho de 2023

Rui Lage - O País à porta

 

O País à porta

 

Se pudesses, O'Neill, ver hoje o teu país, 

(ou tu, Assis Pacheco, filho pródigo

destes quintais floridos)

velho de oito séculos e pouco mais velho

desde que o deixaste,

país que secretamente não vota

para não se maçar

enquanto furta com arte as gaiolas vizinhas

a cantar nas paredes caiadas,

país com mais que fazer

(futebol para ver

e mato para queimar);

 

se pudesses vê-lo agora

não levarias a peito,

mas confirmarias, estou certo, 

que tem defeito de nascença 

ou de fabrico,

mais valendo, por isso, 

como em vida tua valeu,

deitar por terra a lança do ódio,

fechar a navalha do tédio,

sacudir o ombro da solidão

e rir sonoramente de tudo, 

talvez não tanto à porta da pastelaria

como, hoje em dia, à porta dos chineses,

 

mas rir sonoramente de tudo, dizia, 

- de ti mesmo,

sobretudo. 


Rui Lage

 

Sem comentários: