O
abril roxo de um país
“Onde emergimos da noite e do
silêncio
E livres habitamos a substância do
tempo”
Sophia de Mello Breymer
1.
Oh uivo de corpos ecoado por ratazanas
onde um país mergulha além das rosas
no horizonte da envelhecida visitação
dos cravos só raiz de cimento e alcatrão.
*
As palavras alagam-te, ó Portugal de sol
com tufos negros de peixes negros,
os galhos partidos nos olhos da esperança
dos ramos desalentados são um abril roxo.
*
É como se nenhuma manhã inteira e limpa
sob a névoa, como um tal D. Sebastião,
alguma vez tenha irrompido do seu musgo.
*
Palavras não de sol, palavras de flores
secas,
palavras de amor e morte, palavras já só
de
esperança ausente e do medo dessas
palavras.
2.
Uma espera é sempre o puro vislumbre
de um princípio de espaço primaveril,
neste eflúvio mudo do regaço abril
só um cravo partido entre a revolução.
*
já, e o abismo da memória de um país.
E mesmo mudando uns frágeis versos
para perto das águas quentes do rio,
como as rosas tristes, estes cravos são
*
hoje como as grandes escamas secas
de um peixe sufocado no sopro do Tejo.
“Fora existe o mundo”, aqui, a luzente
*
brutalidade da inércia de ti, Portugal:
não, não, esta nunca foi a tua madrugada
esperada, a nossa utopia inteira e limpa!
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