domingo, 14 de abril de 2019

“A Canalha” - Jorge de Sena


“A Canalha”

Como esta gente odeia, como espuma
por entre os dentes podres a sua baba
de tudo sujo sem sequer prazer!

Como se querem reles e mesquinhos,
piolhosos, fétidos e promíscuos
na sarna vergonhosa e pustulenta!
Como se rabialçam de importantes,
fingindo-se de vítimas, vestais,
piedosas prostitutas delicadas!
Como se querem torpes e venais
palhaços pagos da miséria rasca
de seus cafés, popós e brilhantinas!
Há que esmagar a DDT, penicilina
e pau pelos costados tal canalha
de coxos, vesgos, e ladrões e pulhas,
tratá-los como lixo de oito séculos
de um povo que merece melhor gente
para salvá-lo de si mesmo e de outrem.


1 comentário:

josé luis disse...

Disse um dia, em livro, em um poema que intitulei "Uma poesia sublime, franca e brava", do qual vou citar um pequeníssimo trecho; digo assim porque dedicado a Jorge de Sena. Camões foi como pôde, tentando ser alguém, ou mesmo outro, conforme as situações; Pessoa foi uma aspiração genial para um projecto sem gente, um quase desejo sem data marcada, mas com atores escolhidos por catálogo; Sena foi ele, apenas ele, sem limites nem concessões, e tinha como finalidade para a sua audaciosa gesta, o enterro do atavismo nacional.
Para tal escolheu como ator principal, preferido e insubstituível, o nobre povo português, a quem sempre se dirigiu, mesmo quando lhe bateu forte, porque se acordado, manobrado não seria, fosse quem e o que fosse o pretendente. Como Camões e Pessoa, genialidade à solta, mas alma bravia, Sena não fez namoro de vizinhança a quem maneja as decisões, e denunciou tutelas e auto-suficiências com a firmeza seca e clara de quem se regala a expor a sua face diante o espelho.........