sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Gritar - Paul Eluard

Gritar
Aqui a acção simplifica-se
Derrubei a
paisagem inexplicável da mentira
Derrubei os
gestos sem luz e os dias impotentes
Lancei
por terra os propósitos lidos e ouvidos
Ponho-me a
gritar
Todos falavam demasiado baixo falavam e escreviam
Demasiado baixo

Fiz
retroceder os limites do grito

A acção simplifica-se

Porque eu arrebato à morte essa visão da vida
Que lhe destinava um lugar perante mim

Com um grito

Tantas
coisas desapareceram
Que nunca mais voltará a desaparecer
Nada do que merece viver

Estou
perfeitamente seguro agora que o Verão
Canta debaixo das portas frias
Sob armaduras opostas
Ardem no
meu coração as estações
As
estações dos homens os seus astros
Trémulos de
tão semelhantes serem

E o
meu grito nu sobe um degrau
Da
escadaria imensa da alegria

E
esse fogo nu que me pesa
Torna a minha força suave e dura

Eis aqui a amadurecer um fruto
Ardendo de
frio orvalhado de suor
Eis aqui o lugar generoso
Onde dormem os que sonham
O
tempo está bom gritemos com mais força
Para que os sonhadores durmam melhor
Envoltos em palavras
Que põem o bom tempo nos meus olhos

Estou
seguro de que a todo o momento
Filha e avó dos meus amores
Da
minha esperança
A
felicidade jorra do meu grito

Para a mais alta busca
Um grito de que o meu seja o eco.

Paul Eluard
in "Algumas das Palavras"
Tradução de António Ramos Rosa

CRIER
Ici l’action se simplifie
J’ai renversé le paysage inexplicable du mensonge
J’ai renversé les gestes sans lumière et les jours impuissants
J’ai par-dessus terre jeté les propos lus et entendus
Je
me mets à crier
Chacun parlait trop bas et écrivait
Trop bas

J’ai reculé les limites du cri
L’action se simplifie
Car j’enlève à la mort cette vue sur la vie
Qui lui donnait sa place devant moi

D’un cri
Tant de choses ont disparu
Que rien jamais ne disparaîtra plus
De ce qui mérite de vivre

Je suis bien sûr maintenant que l’été
Chante sous les
portes froides
Sous des armures opposées
Les saisons brûlent dans mon cœur
Les saisons les hommes leurs astres
Tout tremblants d’être
si semblables
Et mon cri nu monte une marche
De l’immense escalier de joie

Et ce feu nu qui m’alourdit
Me rend ma force douce et dure
Ainsi voici mûrir un fruit
Brûlant de froid givré de sueur
Voici la place généreuse
Où ne dorment
que les rêveurs
Le temps est beau crions plus fort
Pour
que les rêveurs dorment mieux
Enveloppés dans des paroles
Qui font le beau temps dans
mes yeux
Je suis bien sûr qu’à tout moment
Aïeul et fils de
mes amours
De mon espoir
Le bonheur jaillit de mon cri

Pour la recherche la plus haute
Un cri dont le mien soit l’écho.

Paul Eluard (1940)


1 comentário:

José Corvo disse...

Foi Paul Éluard que levou Picasso para o Partido