terça-feira, 29 de setembro de 2020

SONETO - Antero de Quental


SONETO

 

A cruz dizia à terra onde assentava,

Ao val florido, ao monte nu e mudo

 “– Que és tu, abismo e jaula, aonde tudo

Vive na dor e em luta cega e brava?

 

Sempre em trabalho, condenada escrava,

Que fazes tu de grande e bom contudo?

Resignada, és só lodo, informe e rudo;

Revoltosa, és só fogo e hórrida lava...

 

Mas a mim não há alta e livre serra

Que me possa igualar! Amor, firmeza,

Sou eu só -sou a paz... tu és a guerra!

 

Sou o espírito, a luz! tu és tristeza,

Ó lodo escuro e vil!...” Porém a terra

Respondeu: - “Cruz, eu sou a Natureza!”

 

Antero de Quental

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