sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

ALMA DE CÔRNO - Fernando Pessoa

 

ALMA DE CÔRNO

 

Alma de côrno – isto é, dura como isso;

Cara que nem servia para rabo;

Idéas e intenções taes que o diabo

As recusou a ter a seu serviço –

 

Ó lama feita vida! ó trampa em viço!

Se é p’ra ti todo o insulto cheira a gabo

– Ó do Hindustão da sordidez nababo!

Universal e essencial enguiço!

 

De ti se suja a imaginação

Ao querer descrever-te em verso. Tu

Fazes dôr de barriga á inspiração.

 

Quér faças bem ou mal, hyper-sabujo,

Tu fazes sempre mal. És como um cú,

Que ainda que esteja limpo é sempre sujo.

 

 Fernando Pessoa

Nota: reprodução do poema respeitando a grafia original do fac-símile.


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