Cordial
Não pares, coração!
Temos ainda muito que lutar.
Que seria dos montes e dos rios
Da nossa infância
Sem o amor palpitante que lhes demos
A vida inteira?
Que seria dos homens desesperados,
Desamparados
Do conforto das tuas pulsações
E da cadência surda dos meus versos?
Não pares!
Continua a bater teimosamente,
Enquanto eu,
Também cansado
Mas inconformado,
Engano a morte a namorar os dias
Neste deslumbramento,
Confiado
Em não sei que poético advento
Dum futuro inspirado.
Miguel Torga
Diário XVI,
p.60 Coimbra, 3 janeiro 1991
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