"Da voz entre muralhas"
O osso descarnado
a água escassa
e estes ferros
nos pés
e estes ferros
Este rio de suor
a dor inteira
e esta noite
de granito
e esta noite
Este chicote
rasgando-nos a boca
mas nunca o grito
companheiro
até quando
companheiro
Carlos Maria de Araújo
Araújo, 1960 p.42-3
Carlos Maria de Araújo segundo Jorge
de Sena
[...]
A
sua obra muito breve é por certo das mais notáveis da poesia portuguesa que o
desconhece ainda [...]; e pode considerar-se representada pelos dois livros que
publicou pouco antes de morrer. Poesia extremamente despojada e densa, de uma
intensa severidade formal e de vigorosa emoção contida numa expressão lapidar,
é bem a de um oficiante das trevas, dessas trevas que tão terrivelmente cobrem
a vida e o mundo. Nos seus ritmos curtos e sincopados, sob os quais todavia
flui oculta uma simplicidade quase sentimental, esta poesia significa, como
poucas das recentes, uma fulgurante definição do exílio português, no que ele
tem de amargo e de frustrado, como no que, nele, resiste a tudo e mesmo ao medo
que o verso tenha de sê-lo na boca do poeta, qual este disse num dos seus mais
belos poemas.
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