DE NOITE
Ele vinha da neve,
dos trabalhos
violentos, custosos, da enxada,
cantando a meia
voz, pelos
atalhos.
A mulher,
loura, infeliz,
resignada,
cosia junto
à luz. O rijo
vento
batia contra
a porta mal
fechada.
Ao pé
havia um Cristo,
um ramo
bento
e uma estampa
da Virgem, colorida,
cheia de mágoa, olhando o firmamento…
Uma banca
de pinho, mal
sustida,
vacilante nos pés; um candeeiro,
companheiros daquela negra vida.
O homem,
alto, pálido,
trigueiro,
entrou. Tinha
as feições queimadas,
duras,
dos que
andam, com enxada,
o dia inteiro.
A mulher
abraçou-o. As linhas puras
do seu
rosto contavam já
tristezas
de grandes
e secretas amarguras.
Tinha chorado muito as estreitezas
daquela vida
assim!… Talvez
sonhado
um dia com palácios e riquezas!
Ele deitou-se a
um canto,
fatigado
de erguer-se, alta
manhã, todos
os dias
mal voavam as
pombas do telhado.
Lá fora, nuvens
grossas e sombrias
no pesado horizonte.
Ele assim
esteve
-- as noites
eram ásperas e frias --.
Ela cobriu-o
duma manta leve,
esburacada, velha.
No telhado
ouvia-se cair,
sonora, a neve.
Ela então meditou no seu
passado;
no seu
primeiro beijo,
nas lembranças,
talvez, do seu vestido de noivado,
e nas tardes
das eiras, e das danças
às estrelas,
e aquela vez primeira
que a rosa lhe furtou
das longas tranças;
e aquela tarde,
junto da amoreira,
que trocaram as
mãos; e na janela;
e quando
olhavam, juntos, a ribeira;
e quando
ela tímida
e singela…
…………………..
Lá fora, dava o vento nos caixilhos;
não brilhava no
céu nem
uma estrela.
E, àquela hora
da noite, por
que trilhos
andariam no mundo
– ela cismava –
nas misérias,
talvez, sem
rumo, os filhos!...
Ele, na manta velha,
ressonava.
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